- Quarta, 20 Agosto 2025 10:24
- Escrito por UFC Informa
Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC) avançam no uso da nanotecnologia para criar medicamentos mais eficazes no combate ao câncer, capazes de levar princípios ativos diretamente às células tumorais sem afetar tecidos saudáveis. A estratégia, que promete aumentar a taxa de sucesso dos tratamentos, reduzir contraindicações e amenizar efeitos colaterais, rendeu uma nova patente à UFC.
O desenvolvimento de um lipossoma sensível ao ácido tumoral associado a um anticorpo capaz de reconhecer e se ligar a alvos específicos deu origem a uma “cápsula inteligente” para ser usada no tratamento do câncer de próstata, um dos mais prevalentes e letais entre homens. Essa nanoformulação foi testada com o docetaxel, quimioterápico de primeira escolha no tratamento do câncer de próstata metastático, estágio avançado em que a doença se espalha e forma novos tumores em outras partes do corpo.
Conhecida tecnicamente como nanocarreador, essa cápsula usa como base lipossomas, minúsculas vesículas de gordura com propriedades atrativas, como biocompatibilidade e biodegradabilidade. A essa composição foram adicionados dois componentes lipídicos: dioleoilfosfatidiletanolamina (DOPE) e hemisuccinato de colesterila (CHEMS). Estáveis em pH fisiológico, quando expostos a meios ácidos, como os microambientes tumorais, respondem desestabilizando as vesículas.
Em seguida, na superfície do invólucro foi feita uma ligação química ao anticorpo monoclonal cetuximabe, que se liga a alvos de forma seletiva. No caso, o alvo é a proteína EGFR, que aparece em baixas quantidades em células saudáveis, mas aumenta nos tumores, principalmente em metástases ósseas e cerebrais do câncer de próstata. Essa combinação de estratégias permite uma liberação direcionada do fármaco e possibilita a administração em doses menores.
“O anticorpo funciona como uma ‘chave’, que se liga à ‘fechadura’, que é a célula de câncer. Dessa forma, o docetaxel é liberado principalmente no local onde deve atuar, no tumor, potencializando a ação e reduzindo efeitos colaterais”, explica um dos participantes do estudo, o professor Josimar de Oliveira Eloy, do Departamento de Farmácia e coordenador do Grupo de Pesquisa em Nanotecnologia Farmacêutica (GPNANO) da UFC.
A inovação foi patenteada, pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), à UFC e à Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), que também participou da pesquisa. ”Não podemos deixar de considerar que o cetuximabe já está disponível na clínica, para tratamento de câncer colorretal e câncer de cabeça e pescoço. Dessa forma, estamos contribuindo com evidências para o uso também no tratamento do câncer de próstata”, completa o pesquisador.
Outros tratamentos contra o câncer desenvolvidos na UFC com nanotecnologia aplicada à ciência farmacêutica já receberam cartas-patente, sendo dois também contra o câncer de próstata, doença responsável por 17 mil mortes no Brasil em 2023, segundo dados mais recentes do Ministério da Saúde. Deles, um também trabalha com encapsulamento inteligente, mas para o fármaco cabazitaxel. Assim como o docetaxel, ele atua inibindo a divisão das células tumorais, mas é reservado para casos em que o câncer não responde mais ao docetaxel.
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Atualmente já há produtos baseados em nanotecnologia disponíveis clinicamente para o tratamento do câncer, porém nenhum com este tipo específico de formulação patenteada à UFC. Um artigo sobre o trabalho foi publicado na revista científica Pharmaceutics, posicionada no primeiro quartil (Q1) da categoria “Farmacologia e Farmácia”, o que significa fazer parte dos 25% melhores periódicos da área. Após o sucesso dos ensaios in vitro, a pesquisa segue em andamento com estudos do efeito antitumoral em camundongos.
A pesquisa sobre o uso de imunolipossomas PH sensíveis funcionalizados com anticorpo anti-EGFR cetuximabe para entrega de docetaxel a células de câncer de próstata recebeu financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Além de Josimar Eloy, participam da equipe os pesquisadores Bianca Rodrigues Faria Vasconcelos, Thais da Silva Moreira, Alan Denis Olivindo Silva, Elias da Silva Santos, Ana Carolina Cruz de Sousa, Cláudia do Ó Pessoa e Raquel Petrilli Eloy, todos atualmente na UFC.
NANOTECNOLOGIA - A nanotecnologia é uma área da ciência que manipula a matéria em escalas extremamente pequenas (um nanômetro corresponde a um milionésimo de milímetro). Isso permite que os ajustes sejam feitos com maior exatidão e que os fármacos sejam utilizados em doses menores. Na medicina, a nanopartícula mais conhecida é a da vacina de RNA mensageiro para covid-19, uma nanopartícula lipídica que facilita a entrega de RNA nas células.
A pesquisa foi realizada no GPNANO, laboratório do curso de Farmácia da UFC. Voltado exclusivamente para a nanotecnologia, o grupo tem como carro-chefe o nanoencampsulamento de fármacos antitumorais e a funcionalização com ligantes, como anticorpos monoclonais, para direcionamento ao alvo cancerígeno. Outra vertente importante é o desenvolvimento de técnicas de produção de lipossomas e imunolipossomas, com possibilidade de escalonamento industrial.
Josimar Eloy conta que há pesquisas em andamento com manipulação de lipossomas, nanopartículas poliméricas e até nanopartículas de ouro, com foco no tratamento de câncer de próstata, mas também para outros tumores, com destaque para colorretal, pele e mama. As pesquisas mais avançadas chegaram a estudos em camundongos, modelos para câncer humano. “As perspectivas são imensas e estamos muito empolgados. Pertencemos a um time com vários pesquisadores, cada um com sua expertise nesse desafio de desenvolver medicamentos mais seguros e eficazes para o tratamento do câncer”.
Fonte: Josimar Eloy, professor do Departamento de Farmácia e coordenador do Grupo de Pesquisa em Nanotecnologia Farmacêutica da UFC - e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.