Colação de grau em Crateús celebra as políticas de permanência, as redes de apoio e a escolha pela educação
- Quinta, 25 Setembro 2025 09:37
- Escrito por UFC Informa
Tão continental quanto a extensão geográfica do Brasil é seu conjunto de desigualdades sociais. Nesse contexto, o acesso ao ensino superior ainda representa um desafio para a maior parte da população – mesmo sob o impacto positivo de políticas como o sistema de cotas de vagas e a interiorização das universidades federais.
No Nordeste, a expansão da Universidade Federal do Ceará (UFC) segue como passo fundamental na democratização do ensino público de nível superior. Hoje, moradores de Itapajé, Quixadá, Sobral, Russas, Crateús e de cidades próximas a esses municípios contam com opções de graduação em diferentes áreas.
Entre avanços recentes e abismos históricos, a equação segue desequilibrada: hoje, mesmo com programas de auxílios, bolsas e benefícios, estudar em uma universidade exige de milhões de brasileiros doses excessivas de resiliência.
No último dia 22, essa foi a realidade que mais uma vez ficou clara, durante a colação de grau das turmas de 2025.1 do Campus da UFC em Crateús. Na ocasião, 32 formandos dos cursos de Ciências da Computação, Engenharia Ambiental e Sanitária, Engenharia Civil, Engenharia de Minas e Sistemas da Informação celebraram a conquista do diploma, evidenciando que o esforço, muito mais do que pessoal, é coletivo.
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“Temos um orgulho imenso em dizer que somos formados pela Universidade Federal do Ceará. A UFC não é apenas um espaço de ensino: é uma força transformadora. Sua presença no interior do estado significa muito mais do que prédios e laboratórios, significa inclusão. E o Campus de Crateús é prova disso: aqui, construímos não apenas carreiras, mas futuros para toda uma região”, pontuou o orador discente da cerimônia, José Roberto Aguiar Filho, do curso de Engenharia Civil.
“Aos nossos familiares, dedicamos essa conquista. Muitos de vocês não tiveram a oportunidade sequer de concluir o ensino básico, mas lutaram para que nós pudéssemos chegar a este momento. Vocês nos ensinaram, com exemplos de trabalho, renúncia e amor, que educação é o maior legado que podem deixar”, reconheceu o jovem.
“FARIA TUDO DE NOVO” – É com esse legado que Francisco Italo de Paiva Caxias conta agora, para transformar a vida de sua família. “Fui criado pela minha avó e pela minha mãe, que é agricultora. Antes de minha avó falecer, prometi que, depois de formado, eu assumiria a família, daria uma condição melhor a eles. Queria muito que ela estivesse aqui para presenciar isso”, reconheceu, emocionado.
Apesar da ausência marcante, o grupo de Italo era um dos maiores da noite. Aos 22 anos, ele comemorou o diploma de engenheiro civil ao lado da mãe, do padrasto, do irmão, da irmã, da esposa e dos dois filhos.
Morador do distrito de Aracatiaçu, na zona rural de Sobral, ele contou com a ajuda da mãe para se manter em Crateús nos primeiros anos. “Foi um período complicado, não queria dar esse trabalho, então precisei reduzir meus gastos ao mínimo possível”, recordou o formando. “Quando consegui o auxílio moradia as coisas ficaram mais tranquilas”.
Egresso de escola pública com poucos recursos, Italo ingressou na UFC pelas vagas do sistema de cotas. “Eu venho da base, da base mesmo. Mas se fosse para passar por tudo de novo, passaria, porque isso formou a pessoa que sou hoje”, pontuou.
“TODO MUNDO FOI REDE DE APOIO” – A força de uma rede de apoio e o acesso a auxílios da universidade também marcaram a trajetória de Patricia Pereira da Silva, de 28 anos, graduada em Engenharia Ambiental e Sanitária. Natural de Independência, a 49 quilômetros de Crateús, precisou de ajuda para conciliar a maternidade e os estudos: o pequeno Marx Valentim, hoje com seis anos, chegou em 2019.
“Havia me mudado para cá e morava com uma amiga. Quando ele nasceu, voltei para Independência, porque precisava do apoio da minha mãe. Passei um tempo indo e voltando todos os dias”, recordou.
Em 2022, Patricia retornou a Crateús, onde, além de receber auxílio creche e auxílio moradia, contou com amigos, colegas e professores. “Às vezes o Marx ficava em casa com minha amiga, outras vezes eu o trazia para as aulas. Já cheguei a fazer prova com ele, os professores nunca reclamaram. Todo mundo foi rede de apoio”, reconheceu.
Apesar dos desafios, a jovem teve uma vivência intensa na universidade. Foi bolsista do Programa de Acolhimento e Incentivo à Permanência (Paip), bolsista de extensão e também uma das fundadoras da Liga Acadêmica de Saneamento Rural (Sanearu). Hoje, trabalha na coordenação de turmas de Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Recentemente, ingressou como bolsista pesquisadora no programa federal Dom Hélder Câmara II. “Vou atuar nos territórios de Crateús, Hidrolândia, Ararendá e Independência. Mais pra frente penso em tentar o mestrado”, conta, cheia de planos.
Conterrâneo de Patricia, Cauet Lacerda, de 22 anos, saía cedinho de Independência e retornava tarde da noite, para dar conta de todas as atividades acadêmicas. “Teve momentos em que eu estava fazendo cerca de oito disciplinas por semestre, além do estágio”, conta.
Nesse ritmo, o jovem terminou a graduação antes do tempo previsto. “Vi que era possível e quis me desafiar. Sempre busquei, desde o início do curso, fortalecer contatos no mercado, conhecer pessoas que pudessem transmitir conhecimentos práticos. Antes de completar metade da graduação já estava atuando”, recorda.
No campus, a vivência também foi ampla. Cauet participou do Programa de Educação Tutorial (PET), foi presidente do Centro Acadêmico de Engenharia Civil, assessor de marketing do programa CreaJr, do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Ceará em Crateús, e estagiário da obra do bloco do restaurante universitário e da biblioteca do campus. “Desafie-se, acho que é o melhor conselho que posso dar para quem está começando na universidade”, opina.
O SERTÃO VERDE – Os depoimentos ecoaram no discurso da oradora docente, a professora Luisa Gardênia Tomé Farias, coordenadora do mestrado profissional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos (ProfÁgua). Assim como muitos dos concludentes, ela descreveu sua trajetória acadêmica como repleta de desafios e, ao mesmo tempo, como uma história de transformação – para ela e toda a sua família.
“Aproveitei todas as oportunidades que a UFC me proporcionou. Hoje, como docente, é emocionante ver que muitos de vocês seguiram esse mesmo caminho, aproveitaram as bolsas, os auxílios e os projetos de pesquisa e extensão”, comparou a docente.
“Alguns de vocês foram meus orientandos em projetos como PET, Pibic, PID e de extensão. Acompanhar seu crescimento me lembra a obra Aves de arribação, de Antônio Sales, que descreve o sertão verde depois das chuvas. Hoje, vocês florescem renovados e prontos para novos voos, após todos os desafios e esforços. Vocês se tornaram maiores que o sertão, maiores que este campus, porque levam daqui o conhecimento, os valores e as histórias que refletirão onde quer que estejam”, observou Luisa.
Fechando a cerimônia, o reitor Custódio Almeida reforçou, em seu discurso, o caráter precioso e coletivo de qualquer vitória, sobretudo na educação. “Toda conquista é um novo começo. O encerramento que festejamos hoje é uma conquista fundamental para que a história de cada um de vocês continue a ser escrita com protagonismo, autonomia e a liberdade conquistadas na UFC”, destacou.
"É também um momento de gratidão, pois ninguém se forma sozinho. A aprendizagem é complexa, plural, uma rede de múltiplos pontos. E por isso agradecemos aos professores, aos técnicos-administrativos em educação, aos colegas, aos amigos e familiares que estiveram presentes nessa jornada”, acrescentou o reitor.
“E, de maneira muito especial, eu quero agradecer a cada um de vocês que honrou sua passagem pela UFC, persistindo em suas trajetórias”, finalizou.
Fonte: Secretaria de Comunicação e Marketing da UFC – e-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.